sábado, 20 de novembro de 2010

Palavras da vida

Olha as coisas, pessoas e situações com outros olhos. Porque já não espera algo da vida, espera a vida em si. Confunde sentimentos de pertença, por algo que não é seu e sabe não querer que seja. Num primeiro pensamento que lhe invade, pensa que o melhor era fazer o passado voltar, mas, no primeiro passo sente um impasse, não para que desista, mas um sinal que lhe faz ficar parada, porque talvez seja melhor assim. Para quê não arrumar o passado de vez? Se as coisas ocuparam lugar a um canto do quarto, até agora, poderão permanecer mais um tempo ou até, ficar eternamente. A bolinha estava embrulhada num pedaço de papel de jornal, agora está desembrulhada, e ela abana-a de vez em quando para ver o que a compõe mexer. Foi à uns meses atrás que lhe fez sentido comprar, baseada numa pequena recordação de à 3 anos. Agora está ali, olhando para ela e ela para a bola, até ao dia em que não a olharás mais, como a todas as outras coisas. No passado meteu tudo num saco e o lixo foi o destino. Mas para quê? Doía menos por isso? Não. Vejo isso como actos de raiva, que apenas a faziam ficar mais nervosa, mais triste, mais irritada.
Recorda episódios bons da sua vida, outros menos maus. As coincidências que perseguiram a sua vida: nomes, encontros inesperados no sítio mais improvável, gostos em comum - fora do normal, palavras ditas ao mesmo tempo, presentes iguais...Quando olha para o passado vê uma enormidade de lições de vida, histórias que se juntam e nada têm a ver umas com as outras, com as quais, agora, e de uma vez por todas está disposta a aprender, para que os mesmos erros não se voltem a repetir vezes e vezes sem conta, num ciclo, que não se permitia fechar - por o desejo ser mais forte? Agora outras vontades o são.
Fica parada a olhar o mar e a pensar em todas estas coisas. Nas conversas de café, nos cigarros fumados, nas horas de loucura, nas de desespero, nos momentos de silêncio, nos de muitas palavras, nos que foi ouvida, nos que falou, nos que foi amada, naqueles em que foi rejeitada. São mil coisas que já correram a sua vida, e agora está simplesmente olhando as gaivotas, disposta a viver com mais calma, talvez menos intensamente mas com mais tranqulidade.
Olha os passos na areia, tem patinhas de cães, tão perfeitas. Há pés de humanos, uns em direcção do mar, outros fazendo um percurso que se perde de vista à beira mar. E quantos outros mais? Cruzando uns com os outros, como se cruzam as vidas das pessoas.
Quando vinha no carro ontem ouviu uma música que a fez arrepiar dos pés à cabeça. Não que adore a música, mas pelo significado que teve para si em tempos. Era a música "Hey oh" dos Red Hot Chili Peppers. Na altura em que esta música apareceu, cada vez que estava com uma pessoa que fez parte da sua vida em tempos, esta música passava. Era no carro, em casa por algum motivo sem ser de decisão dos dois, nos cafés, nos bares, nas discos, na praia, em todo o lado. Essa pessoa já saiu da sua vida há uns anos. Tem no entanto a certeza, que em pequenas coisas os seus pensamentos ainda se cruzam, em pequenas recordações como esta. E os arrepios sentidos não são por ainda gostar daquela pessoa, óbvio que não. Apenas porque lhe lembraram todos os momentos passados e as conclusões a tirar de mais uma vivência. Teve vontade de mandar uma mensagem da qual não queria obter resposta, só partilhando aquele momento, aquela recordação, mas, infelizmente, há laços que se quebram e nunca se voltam a restituir.
Daí vem a questão de ser dificil ser amigo ou ter uma relação com alguém com quem já tenhamos tido um relacionamento. Eu acho possível, passado o tempo de luto e quando, ambas as pessoas já sabem o que querem e que não se querem uma à outra. Enquanto uma das partes não tem certeza, enquanto uma das partes continua a gostar e a outra já sabe que o seu caminho não passa mais por ali, é para mim impossível. E, acaba por ser por isso, que ela nunca mais procurou a pessoa em quem pensa agora, nem vai procurar, pelo menos por enquanto, porque nisto, partilha a mesma opinião que eu.
O que ela mais tem saudades da relação com a pessoa agora em questão, é do periodo em que foram amigos, em que ela era puramente genuína, porque não esperava nada dalí. Porque é que quando queremos muito alguma coisa conseguimos agir de tal forma inconsciente que conseguímos transformarmo-nos no que não somos e agir de uma forma totalmente irracional? É isso que ela sente que foi, uma actriz. Não apenas com ele, com outros também. Porquê não ser ela própria, sempre, com os seus defeitos e virtudes, com a sua voz normal, com as suas palavras meigas e duras? Para quê falar como se estivesse sempre num palco, dizendo mil coisas que podem fazer rir, hoje, amanhã, no outro dia talvez, mas que não dizem nada dela, de como pensa, que acabam por cansar. Um mix dos dois é o que ela sabe ser, porque é assim que o é com os seus amigos e amigas, apenas não o consegue ser com aqueles que mais quer e mais deseja, ficando estabilizada por um medo incontrolável e não deixando as palavras racionais e naturais sair.
Foi um fim de tarde produtivo, em que, ao olhar o mar mais uma vez, ela levantou e continuou a sua caminhada, tranquilamente. Chegou ao fim da praia, limpou os pés e andou, rumo ao carro, a mais um caminho.

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